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Especialistas relacionam a LGPD e a possibilidade de surgimento de um contencioso de dados

  • Foto do escritor: Habeas Data
    Habeas Data
  • 11 de jul. de 2020
  • 5 min de leitura

A Luiza Leite, CEO da Dados Legais. Head de educação do Instituto Propague; Co-fundadora da Destro Consultoria Jurídica; Pesquisadora do Laboratório de Estudos Institucionais - LETACI/UFRJ e do Núcleo de pesquisa em Direito e Tecnologia no Lima ≡ Feigelson Advogados; e a Vitória Dantas, Advogada e pós-graduanda em Legal Tech (Direito, Inovação e Startups) pela PUC-MG, publicaram um artigo no Jota, Portal jurídico de grande repercussão nacional, em que discutiram a novela da entrada em vigor da LGPD e o fato de que suas sanções administrativas estarem postergadas não impedem que o cidadão entre com uma demanda judicial requerendo seus devidos amparos quanto ao tratamento de seus dados caso seus direitos não sejam atendidos.


Confira mais esse grande texto abaixo:


Surgimento do contencioso de dados em 3, 2, 1…


É inegável a necessidade de estruturação de ferramentas que resguardem as companhias de um passivo jurídico


Não é novidade que o tema relativo a proteção, transparência e privacidade de dados está causando burburinho e questionamentos em toda a sociedade. O Brasil que, até antes da promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD[1], não possuía uma cultura de debate e preocupação com o tema, tem vivido nos últimos meses uma verdadeira renovação destes conceitos.


Nitidamente, o assunto tem virado objeto de preocupação e curiosidade não só das empresas e do governo, mas também dos consumidores, que se mostram cada vez mais conectados e antenados ao que se tem feito com os seus dados pessoais.


Em meio a tantas dúvidas, incertezas e até mesmo insegurança jurídica, o que se observa é a construção de uma verdadeira novela, que segue à risca as principais características do gênero literário.


Marcada pela sucessividade, a história da LGPD possui um enredo desenvolvido de maneira sequencial, mas com alterações ao longo da narrativa. Dessa forma, a lei que foi promulgada em agosto de 2018, já teve sua entrada em vigor modificada três vezes, com uma primeira prorrogação da vacatio legis para agosto de 2020, através da Lei 13.853/2019; uma segunda postergação, só que da entrada em vigor das sanções administrativas, para agosto de 2021, por meio da Lei 14.010/2020; e uma terceira, com a determinação da entrada em vigor do restante da lei para maio de 2021 pela MP 959/20.


Somado a isso, como uma boa novela, mesmo com todas essas alterações não se sabe ao certo quando a lei entrará em vigor, dado que o tempo e espaço são definidos pela pluralidade dramática, pois as ações dos personagens são responsáveis por deslocá-los para diferentes ambientes na narrativa.


Nesse sentido, essa definição dependerá das ações do senado e congresso que agora terão que agir em cima da MP 959, o que de fato traz emoção para história e proporciona momentos de catarse, que variam entre euforia e desespero, nas empresas que estão em processo de adequação.


Desta maneira, no caso de tais personagens optarem por não votar a MP e esta venha a caducar, a lei entrará em vigor em agosto de 2020. Entretanto, se suas ações forem no sentido de aprovar a referida medida sem ressalvas ou vetos, a lei passa a vigorar em maio de 2021.


Agora, sendo essa votada e o texto sofrendo alteração, o desfecho desse capítulo torna-se um verdadeiro plot twist, não sendo possível prever qual nova data será sugerida.


Dessa forma, vemos novos personagens surgirem,  assim como outros serem retirados da trama, tudo em prol do fio narrativo. Nesse aspecto, a ANPD que de início foi criada para exercer o papel de protagonista da trama, não conseguiu ter força nem popularidade a ponto de seguir em destaque, por isso foi rebaixada a personagem coadjuvante, perdendo espaço para o Ministério Público, Procon, Justiça Estadual, Federal e outros órgãos, que passaram a fiscalizar e colocar em prática as diretrizes da LGPD.


Outro ponto que deve ser levantando aqui é que, ao contrário do que acontece com o conto, a novela desenvolve vários enredos ao longo da narrativa, que podem estabelecer conexões entre si.


Dessa forma, na novela da entrada em vigor da LGPD vivemos três momentos: (i) empresas que já deram o start em seu processo de adequação à norma; (ii) empresas que diminuíram a urgência de adequação dado que as sanções administrativas foram postergadas para 2021; e, (iii) empresas que vão pagar para ver, pois acreditam que a lei não vai pegar.


Ocorre que, nesse ponto entra um personagem importante na nossa narrativa, o titular de dados. Como bem dispõe o art. 17 e seguintes da LGPD, os titulares de dados conquistaram inúmeros direitos e garantias relativas as suas informações pessoais, que poderão ser requisitadas, modificadas e questionadas a qualquer momento.


Desse modo,  com a entrada em vigor da LGPD, todo cidadão poderá requerer ao controlador por meio simples, facilitado e imediato a (i) confirmação da existência de tratamento; (ii) acesso aos dados; (iii) correção de dados incompletos, inexatos ou desatualizados; (iv) anonimização, bloqueio ou eliminação de dados desnecessários e excessivos; (v) portabilidade dos dados; (vi) eliminação dos dados pessoais tratados com o consentimento do titular; (vii) informação sobre uso compartilhado de dados e  implicações do não fornecimento do consentimento; e (ix) revogação do consentimento.


Entretanto, pouco se observa falar sobre um canal de comunicação com os titulares e sobre como se dará a efetivação. E aqui chegamos no clímax da história.


Isso pois, embora as sanções administrativas tenham sido postergadas para agosto de 2021, a entrada em vigor da lei não afasta a responsabilidade civil das empresas perante esses direitos.


Dessa forma, as empresas devem estar preparadas e organizadas para atender a essas novas garantias que irão requerer cada vez mais processos operacionais e automatizados, além de equipes profissionais devidamente capacitadas para lidar com as futuras demandas.


Visto que, o fato de a LGPD e suas sanções administrativas postergadas não impede o cidadão de entrar com a sua demanda judicial requerendo seus devidos amparos quanto ao tratamento de seus dados caso seus direitos não sejam atendidos, podendo ser requeridos danos morais e materiais.


Nesse contexto, dado a cultura litigiosa que existe no Brasil, havendo o julgamento de cerca de 30 milhões de processos judiciais por ano[2] e a facilidade de acesso ao judiciário, o que se imagina é o surgimento de um fenômeno parecido com o que ocorreu com o surgimento do Código de Defesa Consumidor, elevando o numero de ações judiciais.


Além disso, ao que tudo indica, ocorrerá a incidência da regra da inversão do ônus probatório ao contencioso de dados envolvendo o tratamento irregular ou inadequado dos dados de consumidores, seja porque o CDC prevê de forma expressa essa inversão, de forma a facilitar a busca pelos direitos dos consumidores em juízo, seja porque a própria LGPD faz menção à possibilidade de utilização do diploma consumerista em tal hipótese[3].


Dessa forma, realizar o “trackeamento”  dos processos de atendimento e fluxos dos dados pessoais se faz necessário para que se consiga ter provas de que os direitos dos titulares foram atendidos nos termos da lei.


O desfecho desta história não está próximo do fim. Mas, é inegável a necessidade de estruturação de ferramentas e procedimentos para que resguarde as companhias de um passivo jurídico referente a dados. Enquanto não temos a data de entrada em vigor da lei, nós vamos acompanhando as cenas dos próximos capítulos.



[1] Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13709.htm>. Acesso em: 12 de junho de 2020.



LUIZA LEITE – CEO da Dados Legais. Head de educação do Instituto Propague. Co-fundadora da Destro Consultoria Jurídica. Pesquisadora do Laboratório de Estudos Institucionais - LETACI/UFRJ e do Núcleo de pesquisa em Direito e Tecnologia no Lima ≡ Feigelson Advogados.


VITÓRIA DANTAS – Advogada e pós-graduanda em Legal Tech (Direito, Inovação e Startups) pela PUC-MG.

 
 
 

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