Artigo de professor e de estudante da UFRJ discute os JEC's como “laboratório experimental”
- Habeas Data
- 10 de jun. de 2020
- 4 min de leitura

O professor de Direito Processual Civil da FND, Hugo Filardi Pereira, e o graduando da FND e pesquisador do Laboratório de Regulação Econômica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ Reg.). Leonardo Parizotto Gomes, publicaram no Estadão um importante artigo denominado "Audiências virtuais nos Juizados Especiais. O futuro do Judiciário é agora!" em que discutem os Juizados Especiais Cíveis como um “laboratório experimental” para implementação de inovações jurídicas benéficas aos jurisdicionados, sendo a realização de conciliação não presencial mais uma delas.
A UFRJ, por meio daqueles que a constroem, demonstra mais uma vez a razão de ter sido classificada pelo sétimo ano seguido como a melhor federal do Brasil.
Confira o artigo abaixo:
Audiências virtuais nos Juizados Especiais. O futuro do Judiciário é agora!
Hugo Filardi Pereira: Mestre e Doutor em Direito Processual Civil pela Pontifica Universidade Católica de são Paulo (PUC/SP); membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), sócio do Siqueira Castro Advogados e professor de Direito Processual Civil da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ.
Leonardo Parizotto Gomes: Graduando em direito pela UFRJ, membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio de Janeiro (IDAERJ), membro do Laboratório de Pesquisa em Direito Administrativo e estagiário pesquisador do Laboratório de Regulação Econômica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ Reg.).
O Projeto de Lei n° 1.679/2019, de autoria do então Deputado Federal Luiz Flávio Gomes (PSB-SP), transformada na Lei Ordinária n° 13.994/2020, altera os arts. 22 e 23 da Lei n° 9.099/1995, a fim de possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis.
Na justificação do PL, Luiz Flávio Gomes argumentou que o projeto objetiva incluir a possibilidade de conciliação não presencial nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, utilizando telefone, e-mail e aplicativos de comunicação instantânea, como WhatsApp, Messenger e outros.
A referida modificação no art. 22, § 1°, determina que, quando obtida à conciliação, o juiz togado deverá reduzi-la a termo e homologar mediante sentença com eficácia de título executivo. Assim, abriu-se a possibilidade para a realização de conciliação não presencial nos JECs, conforme o § 2º do novo art. 22 da Lei de Juizados Especiais, o qual ocorrerá mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito com os anexos pertinentes. O novo art. 23 dispõe que, caso o demandado não comparecer ou se recusar a participar da tentativa de conciliação não presencial, o magistrado deverá proferir sentença.
Com isso, propende-se a pensar que o PL é resultado direto das necessidades decorrentes da pandemia, porém, não estamos diante de uma alteração passageira, mas permanente. O projeto em questão foi encaminhado no dia 21 de março de 2019.
O avanço tecnológico está cada vez mais presente no âmbito jurídico, principalmente nos Juizados Especiais. Desde 2015 a inovação é percebida em alguns JECs, como é o caso do Juizado Especial Cível e Criminal de Piracanjuba, que, devido a Portaria n° 1 daquele ano, ocorre a utilização do aplicativo de mensagens WhatsApp para a pratica de comunicação processual. Posteriormente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através de um procedimento de Controle Administrativo, aprovou a utilização do aplicativo como ferramenta de comunicação processual.
Percebe-se, portanto, que os Juizados Especiais, há tempos, servem como um “laboratório experimental” para implementação de inovações jurídicas benéficas aos jurisdicionados. Como dito em artigo publicado no JOTA, a segurança jurídica não deve ser tratada pelos operadores de direito como algo intrínseco a intransigência dogmática processual, por mais que esta auxilie aquela. Isto é, os institutos devem se desenvolver de forma que possibilitem uma prestação jurisdicional cada vez mais célere e eficaz. Por outro lado, a burocracia dogmática não deve ser vista apenas como um empecilho positivado, pois, de fato, sua incidência é importante, mas não ao ponto de propiciar uma inflexibilidade que simplesmente dificulta a tutela adequada a ser exercida pelo Poder Judiciário.
O Art. 2° da Lei n° 9.099/1995 dispõe sobre os critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação; os quais, notavelmente, são atendidos. Assim, a Lei n° 13.994/2020 cumpre o seu papel ao regular uma inovação que possui conteúdo material judicioso e que está de acordo com os princípios que regem os Juizados Especiais.
Além disso, as modificações suprem a lacuna do Art. 334, § 7º, do Novo Código de Processo Civil, o qual admite a realização de audiência de conciliação por meio eletrônico, mas que não foi regulamentada no âmbito dos JECs até então.
No entanto, cabe ressaltar que o legislador foi tímido, pois poderia ter estabelecido, também, a possibilidade de realização de audiências de instrução e julgamento (AIJ) não presenciais, bem como ter regulamentado as sessões de julgamento nas Turmas Recursais considerando as possibilidades de sustentação à distância. Tendo como exemplo, o Processo n° 0830193-55.2019.8.23.0010 do JEC de Boa vista (Roraima), no caso Antônio de Souza Araujo x TIM, teve a realização da AIJ por videoconferência. Outro caso notório de inovação ocorreu na 2a Turma do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), na sessão de julgamento do Processo n° 00068166120188050063, Agnaldo Cordeiro Ramos x TIM, que foi transmitida por canal no YouTube, em que a participação do advogado em sustentação ocorreu por canal de áudio.
O legislador poderia ainda ter adotado a técnica de flexibilização de procedimento nos Juizados Especiais, permitindo inclusive a dispensa das audiências, como ocorreu no Processo n° 0047725-79.2020.8.19.0001 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ).
Além disso, a Lei 9.099/1995 deve ser interpretada em consonância à Lei 11.419/2015, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, servindo de justificativa para a realização de audiências por videoconferência.
No momento, resta-nos acompanhar como ocorrerá a implementação prática desta inovação. O CNJ, através da Portaria n° 61 de 2020, institui a Plataforma Emergencial de Videoconferência para a realização de audiências e sessões de julgamento nos órgãos do Poder Judiciário, no período de isolamento social provocado pela pandemia do covid-19. Assim, alvitra-se dizer que o CNJ deve deliberar para a instituição permanente deste tipo de plataforma, principalmente nos JECs, a fim de trazer eficácia a referida lei.
Comments